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Manoel, tamos fudidos? Tamos fudidos, Manoel?




Caro Manoel

Não sei bem se estamos "fudidos" ou fodidos.

Mas enquanto houver "bucetas"...

Ah, "bucetas" ou bocetas?

Na língua portuguesa o termo boceta designa “caixinha redonda, oval ou oblonga, feita de materiais diversos e usada para guardar pequenos objetos”, conforme se vê nos vários dicionários existentes. Porém, nos dicionários de língua portuguesa brasileiros vê-se que a palavra pode designar também a vulva.

Aliás, no Brasil, salvo raras exceções, não se costuma utilizar o termo boceta para outra coisa senão “vagina”, ao contrário de Portugal e os demais países lusófonos, em que boceta não designa outro elemento senão “caixinha”.

Em geral o uso da palavra “boceta” é tido como um modo chulo de se referir ao órgão sexual feminino, um “nome feio” que deve ser evitado pelas pessoas de fino trato.

Mas por que razão a designação de “boceta” para a vulva se deu e, o que é mais intrigante ainda, por que esse apelidinho adquiriu conotação de linguajar chulo? Ora, se boceta é caixinha, não se poderia deixar de considerar bonitinha, terna e carinhosa a sua designação para vulva, designação, aliás, que parece ser até mais agradável que as próprias palavras vulva e vagina, ou mesmo xoxota e grande parte das zilhões de designações disponíveis para a vagina.

Em muitos dos mitos que compõem o imaginário de nossa civilização a figura feminina está associada ao mal, ou pelo menos é responsabilizada pela presença do mal e culpada pelos sofrimentos dos mais variados.

O mito de Adão e Eva é talvez o mais disseminado entre nós, em que se atribui à Eva personalidade fraca que sucumbe à tentação da curiosidade e que convence o seu incauto companheiro a incorrer no erro de fazer o que é proibido.

Mas o mito judaico/cristão não é o único a atribuir às mulheres a culpa pelas intempéries sofridas, fato que, aliás, justificou perseguições das mais variadas às mulheres, ora vistas como bruxas, ora vistas como demônios, enfim, amiúde associadas à queda e, por essa razão, tidas como seres indignos de confiança e por aí afora.

Essa visão negativa em relação à feminilidade é uma constante em todas as civilizações em que o macho é dominante, do Oriente ao Ocidente, das mais ancestrais às modernas; enfim, quando as mulheres não são vítimas de violências das mais variadas, morais ou físicas, comumente os machos adotam uma postura paternalista em que elas devem ser postas numa redoma protetora e lá permanecerem para que não sofram as hostilidades do corpo social e da própria selva que é o mundo.

Suas vontades não existem, ou são irrelevantes. Da proteção do pai se passa à vara do marido.

“O mundo é a casa do homem e a casa é o mundo da mulher”.

Mas voltemos ao tema da boceta e a utilização depreciativa desse termo para designar xoxota.

Dentre os vários mitos existentes que descarregam culpa sobre as mulheres, consta a narração grega sobre a Caixa de Pandora, que os portugueses do período colonial e igualmente os de hoje designam Boceta de Pandora.

Pandora significa “aquela que possui todos os dons.”

Na mitologia Pandora foi criada por Hefesto (Vulcano), o Deus das Artes, cumprindo ordens de Zeus, que ordenou a Hefesto que modelasse uma mulher semelhante às deusas imortais e que ela fosse muito dotada.

Poucas horas depois, Hefesto chegou com uma estátua de pedra que retratava uma belíssima e encantadora donzela.

Ela era linda e clara como a neve. Atená (Minerva) lhe deu a vida com um sopro e ensinou-lhe a arte da tecelagem; os outros deuses dotaram-na de todos os encantos; Afrodite (Vênus) deu-lhe a beleza, o desejo indomável e os encantos que seriam fatais aos indefesos homens. Apolo confere-lhe a voz suave do canto e a música; as Graças embelezaram-na com lindíssimos colares de ouro; e Hermes (Mercúrio), a persuasão.

Em outras palavras, Hermes deu-lhe graciosa fala enchendo-lhe o coração de artimanhas, imprudência, ardis, fingimento e cinismo, mentira e astúcia.

Por tudo isso ela recebeu o nome de Pandora (”a que possui todos os dons”). E da forma mais perfeita e eficaz fez-se o malefício.

Zeus enviou Pandora como presente a Epimeteu cujo nome significa (”aquele que pensa depois” ou “o que reflete tardiamente”).

Epimeteu havia sido avisado por Prometeu para não aceitar nenhum presente dos deuses, mas, encantado com Pandora, desconsidera as recomendações do irmão.

Pandora chega trazendo em suas mãos um grande vaso (pithos = jarro) fechado que trouxera do Olimpo como presente de casamento ao marido.

Pandora abre-o diante dele e de dentro, como nuvem negra, escapam todas as maldições e pragas que assolam todo o planeta.

Desgraças que até hoje atormentam a humanidade.

Pandora ainda tenta fechar a boceta divina, mas era tarde demais: ela estava vazia, com exceção da “Esperança”, que permaneceu presa junto à borda da caixa.

A única forma do homem para não sucumbir às dores e aos sofrimentos da vida.

Assim, essa narração mítica explica a origem do males, trazidos com a perspicácia e astúcia “daquela que possui todos os dons”.

A expressão “Boceta de Pandora” é usada em sentido figurado quando se quer dizer que alguma coisa, sob uma aparente inocência ou beleza, é na verdade uma fonte de calamidades.

Abrir a Caixa de Pandora significa que uma ação pequena e bem-intencionada pode liberar uma avalanche de repercussões negativas; e abrir essa boceta é normalmente prerrogativa das mulheres.

Pois bem, se o mal que provém da abertura da boceta é responsabilidade feminina, não foi difícil aos sátiros do Brasil colonial, especialmente Gregório de Matos, passarem a associar a tal boceta às mulheres e, rapidamente, à vagina das mulheres, origem de todos os males; mas logo em seguida, de forma mais poética e quase nada pejorativa, nossa perdição, boceta que nos arrebata, que nos põe febris, que nos embriaga de amor e dentro da qual toda a nossa esperança reside!!!

Quanto à palavra buceta, não consta de nosso léxico, mas a licença poética tem consagrado o uso por nosso País afora.

Então aí está a esperança; não estamos fudidos, há bucetas.

José Renato Gaziero Cella

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